Uma reza por Herbert Vianna

(foto: studioleco)

Tava agora falando com a Joh sobre o Herbert Vianna e sobre como foi terrível o que aconteceu com ele. Na época que ele sofreu o acidente, eu trabalhava no Rockwave e, cada vez que havia uma notícia nova sobre a recuperação dele, redigia com o cuidado de quem reza.

... reza.

Voltei vinte anos na memória, de novo pra 1989, bem no finalzinho do ano.

Foi quando eu estava esperando sair o resultado do conselho de classe pra saber se eu poderia fazer as cinco provas de recuperação que tinha pego.
Eu rezava e rezava pra caralho, porque já tinha bombado a oitava série e meu pai ia comer meu cu com areia e brita caso eu bombasse mais uma vez.
Nesse tempo que fiquei esperando o resultado, declarei folga.
Não que tivesse estudado muito até lá, mas não fazia sentido estudar se não sabia ainda se ia poder fazer as provas.
Sei que a Gazeta tinha uns programas especiais que passavam de madrugada e, num desses, eles fizeram uma edição especial só com Bowie. É uma pena não ter isso gravado ainda. A linguagem era aquela coisa adorável que a Gazeta fez no fim da década de 80, quando se dizia uma TV desindexada. Era época do TV Mix, dos seus repórteres abelhas e de tudo aquilo que depois de um tempo foi servir de escola pra MTV Brasil.
Naquela época, havia um comercial institucional da FAB, eu acho, que tinha o Herbet Vianna declamando um poema que era praticamente uma reza.
Aquilo me deixava encantado porque eu gostava do Herbert e eu estava precisando de uma boa reza.
Quando fui gravar o programa do Bowie, tive o cuidado de soltar o REC um pouco antes da hora pra gravar o tal vídeo do Herbert. Anotei as palavras daquele poema que ele recitava e guardei na carteira. Era um poema para Santa Clara, que dizia “Santa Clara, clareai”.
Em pouco tempo, as coisas realmente clarearam.
Deram permissão pra que eu fizesse recuperação, passei a estudar que nem um filho da puta e, de vez em quando, lembrava do poema que passei a carregar transcrito em um papelzinho dentro da carteira.
Passei de ano – sofrido e bonito.
E os anos passaram.
Perdi a carteira, perdi o poema, perdi o VHS com especial e o tempo foi se encarregando de apagar aquilo da minha memória.

“Trac-Trac”, dos Paralamas me lembrou disso depois. Tenho essa mania de chamar a música de “Expresso do Oriente” e achar que o “oriente” do Herbert é do verbo orientar.
Como o “clarear” da Santa Clara.

E aí, quando deu aquela merda daquele acidente com o Herbert, eu tava com um “Estrela da Vida Inteira”, do Manuel Bandeira em casa.
A primeira coisa que fiz foi procurar no índice algum poema que dissesse “Santa Clara”, no título.
Não achei nenhum, mas fui lendo o livro assim mesmo, até que chegou num poema que chama “Oração Para Aviadores” e cada letra saía do papel com a voz do Herbert, numa reza.

O poema segue abaixo e, por mais que ele seja do Manuel Bandeira e se chame “Oração Para Aviadores” (errei e sintomaticamente digitei “avidadores” - meus erros de digitação também são friamente calculados), pra mim ele sempre vai ser “Reza pelo Herbert Vianna”.

Oração para Aviadores

Santa Clara, clareai
Estes ares.
Dai-nos ventos regulares,
de feição.
Estes mares, estes ares
Clareai.

Santa Clara, dai-nos sol.
Se baixar a cerração,
Alumiai
Meus olhos na cerração.
Estes montes e horizontes
Clareai.

Santa Clara, no mau tempo
Sustentai
Nossas asas.
A salvo de árvores, casas,
E penedos, nossas asas
Governai.

Santa Clara, clareai.
Afastai
Todo risco.
Por amor de S. Francisco,
Vosso mestre, nosso pai,
Santa Clara, todo risco
Dissipai.

Santa Clara, clareai.

PS: não achei o vídeo na net. =D

PP (que quer dizer 'pós-post'):

Joice: não entendi
vc chama uns dias de expresso do oriente ou trac trac de expresso do oriente?
trac trac?
me (este sou eu): putz!
eu fiz uma sopa
Joice: de letrinhas
me (eu de novo): na real, eu chamo uns dias de expresso do oriente e trac trac continua sendo trac trac
Joice: hahahaha tah
me (vc entendeu que 'me' sou eu, né?): hahahahahahaha
eu vou botar isso de adendo

(botei)