Mostrando postagens com marcador cerejeira. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador cerejeira. Mostrar todas as postagens

21.7.09

pequenos contos do bosque do museu imperial




foi em 1995, que, em virtude das comemorações dos 100 anos das relações entre brasil e japão, o bosque do museu imperial recebeu novos habitantes: dezenas e dezenas de cerejeiras.
os esquilos do bosque acharam a notícia nojenta em um primeiro momento, mas esquilos são ansiosos e nem sempre ouvem as palavras certas. quando souberam que se tratava de cerejeiras, as árvores onde nascem cerejas, aquietaram-se e jamais contaram pra ninguém que, num primeiro momento, entenderam que o bosque ia receber uma nova população de varejeiras – o que, neste caso sim, seria nojento.
a cerejeiras, no entanto, cativaram a todos os moradores do bosque na ocasião de sua chegada. corteses como são as cerejeiras, forraram o chão com suas flores enquanto as carpas explicavam para quem quisesse ouvir que as cerejeiras simbolizam o amor.
as carpas conheciam as cerejeiras dos velhos jardins do japão do período edo e, por isso, serviam de intérpretes e ensinavam tanto as cerejeiras a se entenderem com os outros habitantes do bosque quanto o contrário.
o problema era um só: as camélias.
antes da chegada das cerejeiras, as camélias eram tidas como as flores mais notáveis do bosque e, evidentemente, não ficaram nada contentes com a concorrência.
verdade é que as camélias começaram a maldizer as cerejeiras e o resto do bosque, porque as árvores são sábias como o tempo, ria das camélia e, em coro, cantava o jingle de um velho comercial de papel higiênico. os pinheiros balançaram ao vento, achando que era natal de novo e as azaléias – que, embora pouca gente saiba, são fatalistas como só elas – diziam com voz de menina ranheta: “acabou o natal”.
ao fim do coro, uma carpa branca e cega – que provavelmente não assistiu “pelé eterno” e, portanto, não sabe a hora de parar – saltava a ponto de levantar seu corpo todo acima do nível da água da fonte em que vivia e, com sua boca de peixe, ria em glubglubês e repetia “CU”.
lá no alto um atento bem-te-vi reparou uma lágrima verde correndo por entre as camélias e, alcoviteiro que é, gritou “BEM-TE-VI” pra todo bosque ouvir.
um casal de namorados que passeava por ali, sobre o carpete de flores que as cerejeiras deixavam, olhou pra cima no mesmo momento e, em um pensamento alquímico, respondeu ao bem-te-vi: “bem assim, nunca viu não”.
então, indiferentes ao ruço que descia o morro, as árvores todas farfalharam suas folhas num riso, silencioso e sábio como o tempo, que parecia um sinal da chuva que viria.
chuva que, de fato, veio.
Share: