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25.5.09

As bolas de Ali (divididas em várias partes) Pt.05



Como íamos dizendo: a luta entre George Foreman e Muhammad Ali foi, pra muita gente, a maior de todas as exibições de boxe que já se viu.

Os dois lutaram em outubro de 1974, no Zaire, na África, e o mundo todo previa uma derrota de Ali.
Howard Cosell, analista de boxe e um dos grandes entusiastas de Ali, declarou o favoritismo de Foreman ao dizer que Ali não era mais aquele.
Ali prontamente respondeu dizendo: “Você sempre diz isso: 'Muhammad, você não é mais o mesmo homem que era 10 anos atrás'. Bom, eu perguntei pra sua esposa e ela me disse que você não é o mesmo homem que era DOIS anos atrás”.

O fato é que ninguém botava fé em Ali.

Mesmo em seu corner, todo mundo achava que, naquela noite, no Zaire, Ali seria vítima da própria arrogância.
O que aconteceu foi o seguinte: existe um tipo de golpe, que meio uma mistura de jab com um direto, que nenhum lutador jamais ousaria em uma luta desse porte.
O motivo é simples: você tem que ser muito rápido fazendo isso porque esse tipo de golpe deixa sua guarda aberta para um gancho de esquerda que, caso venha de Foreman, pode arrancar sua cabeça fora.

Foi com esse tipo de golpe que Ali atingiu Foreman DOZE vezes no primeiro assalto.

É uma molecagem.
É o tipo de coisa que sujeito precisa saber MUITO pra se meter a fazer.
Tanto que nenhum dos sparrings de Foreman, todos regiamente pagos para emular Ali, pensou em tentar uma coisa dessas.
É como dar um chubaba no Chewbacca: ele vai arrancar seu braço.
Só que, como em luta de boxe é proibido arrancar o braço dos outros, Foreman ficou POSSESSO e foi pra cima de Ali como um trator.

Daí, Ali botou em prática a segunda parte do seu plano.

Foreman tinha um cartel de 40 lutas, com 40 vitórias e 37 delas por nocaute e a grande maioria delas não passou do terceiro assalto. Daí, Ali tirou a teoria de que Foreman talvez não estivesse preparado para ir além do quinto round.
Por isso, ele se retraiu para as cordas, deixou com que Foreman batesse tanto quanto pudesse no seu corpo, metia uns contragolpes de vez em quando e – durante todo o tempo – ficou provocando o campeão, dizendo pra ele coisas como: “Como é, George? Isso é tudo que você tem?”.

No sétimo assalto, Foreman estava exausto e seus golpes não eram mais aqueles do começo da luta. Daí, Ali saiu das cordas e desceu porrada. Foreman voltou parao oitavo round disposto a acabar a luta, mas Ali o fez antes, atraindo o campeão para o centro do ringue e com uma sequência perfeita de golpes, derrubou Foreman, que não levantou mais.



Aqui embaixo tem o vídeo do oitavo assalto da luta.
Pode reparar que Ali derruba Foreman faltando quase dez segundos pro fim do assalto.
Percebe que ele chega a armar um último soco e não solta a mão?
Seria desumano.
Seria desonrado.
Seria desnecessário.



Pra ser “o maior de todos” ele já havia aprendido a perder.
No Zaire, Ali mostrou – de um jeito indiscutível – que sabia ganhar tanto com os punhos quanto com a inteligência.

E, quando Foreman disputou o título mundial mais uma vez, aos 45 anos, Ali decidiu não ir à luta pra não chamar atenção indevida.
“É o momento do George”, disse ele, que tem Foreman ainda hoje como um de seus melhores amigos.
Ou seja: além de tudo, Ali deve ser beta-tester de toda linha George Foreman Grill.
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22.5.09

As bolas de Ali (divididas em várias partes) Pt.04





Em 1964, quando se alistou no exército, Ali foi dispensado porque não sabia escrever direito.
Em 1966, estourou a guerra no Vietnã e, a exemplo do que havia sido feito com Elvis Presley, Ali foi convocado.

Quando soube disso, Ali declarou que não iria lutar – nem fodendo – pelo exército dos EUA e cunhou a histórica frase:
“Não tenho problema nenhum com vietcongues. Nenhum deles nunca me chamou de 'nigger'”.

Ele foi até o comitê de alistamento militar em 1967 só para ouvir o nome “Cassius Clay” ser chamado três vezes sem que ele respondesse.

Foi advertido que chamariam pelo seu nome mais uma vez e que, caso ele se recusasse a atender, ele poderia pegar 5 anos de cadeia e pagar uma multa de dez mil dólares.
Chamaram “Cassius Clay” e ele nem se moveu.

No mesmo dia, a New York State Athletic Commission retirou de Ali o título de campeão mundial, cassou sua licença pra lutar e, logo depois, todas as outras federações de boxe fizeram a mesma coisa.

A coisa era simples: ele poderia ir para guerra, ficar por lá sem fazer nada, numa casa só dele e ter motorista só pra ele, mas era uma questão de princípios.

Põe no google aí e vê o tanto de tumulto racial que rolou no fim da década de 1970, nos EUA (tá, vai: clica aqui, bicho preguiça) .

Quando Ali disse que não iria para a guerra era 1967 e a música que estava em primeiro lugar nas paradas era “The Ballad Of The Green Berets”, uma canção patriótica em honra os boinas verdes.

A mídia sustentava – porque ainda era possível – que a guerra no Vietnã era outra coisa além do que realmente era: uma insensatez sem tamanho.

Um ano depois, assassinaram Martin Luther King.

A guerra era lá, do outro lado do mundo, mas Martin Luther King foi assassinado, baleado, silenciado.
Debaixo do nariz de todo mundo.
E não foi no Vietnã: foi em Memphis.

Não demorou muito pra que a posição de Ali, que foi julgada anti-patriótica no início, passasse a ser a mais patriótica que havia.

Tão logo isso ficou claro, a Suprema Corte tratou logo de devolver a licença de Ali alegando que ela havia sido injustamente cassada.

Para retomar o título foi um pouco mais difícil.

Depois de algumas lutas, Ali pôde enfrentar Joe Frazier, que era o campeão invicto.

Foi uma luta feroz, entre dois pugilistas invictos – ambos campeões mundiais.

Pra que você tenha uma vaga idéia da proporção do evento (carinhosamente apelidado de “Luta do Século”), Frank Sinatra não conseguiu comprar ingressos para a luta e, teve que arrumar, junto a revista Life, uma credencial de fotógrafo e fez o registro das imagens para a publicação.

A luta foi pau a pau até o décimo-quinto assalto – um lutador que vinha de três anos de meio de inatividade contra o campeão mundial dos pesos pesados – até que um gancho de esquerda, duro e limpo, derrubou Ali e definiu o combate em favor de Frazier.



Pela primeira vez, aquele que se dizia “o maior de todos” foi obrigado a lidar com a derrota.

Ali fez isso com dignidade.

Assumiu a derrota sem desculpas e ficou imóvel, com uma expressão aterrorizante.

Era assim que ele estava, no vestiário, quando Diana Ross, inconsolável, chorava em seu colo, sem botar fé que o maior de todos havia sido derrubado.

Deu a impressão de que ninguém acreditou naquela derrota. Só de uma pessoa: o próprio Ali.

Ele ruminou aquela derrota sem a menor autopiedade e tirou dela tudo que pode.

Depois disso, ele ainda sofreu outra derrota, contra Ken Norton, e essa, literalmente, não foi fácil de engolir.

Acho que foi no segundo assalto que Norton quebrou o maxilar de Ali.

Seu técnico, Dundee, quis pedir o fim da luta, mas Ali disse que não.
“Eu consigo derrubar esse vagabundo”, disse ao técnico.

A luta se arrastou por doze assaltos e, no fim, em decisão dividida, o júri deu vitória à Norton.

Depois da luta, Ali concedeu entrevista mesmo sem poder abrir a boca e os médicos que o examinaram consideraram impossível que qualquer ser humano agüentasse lutar os dez assaltos que Ali lutou no estado físico em que ele lutou.

Percebe que é fácil ser “o maior” ganhando, mas que é foda pra caralho continuar sendo quando se está perdendo?

Ali fez revanche contra os dois e ganhou dos dois, mas não ganhou o título.

O título era de George Foreman que derrotara não só Joe Frazier, como também Ken Norton – ambos no segundo round.

Frazier foi massacrado: Foreman o derrubou seis vezes em quadro minutos e meio.

A luta entre George Foreman e Muhammad Ali foi, pra muita gente, a maior de todas as exibições de boxe que já se viu.

Mas ela é o tema da próxima parte.
Se você quiser a coisa completa, procure o documentário "Quando Éramos Reis", de Leon Gast, e, aí sim, você vai saber o que foi aquilo.
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