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8.6.09

elegia




Conheci o Sandro Anderson assim que ele começou a trabalhar na 89. Deve ter sido, se não me engano, no finalzinho de 1995. A lembrança tem essa data por causa da festa de aniversário da Eliana, que, na época, era locutora da 89. Ela faz aniversário no dia 26 de dezembro e deu uma festa no salão do prédio dela e o Sandro foi também. Era o primeiro evento social que ele ia como funcionário da 89 e ele estava meio nervoso de ir porque não conhecia muita gente e tal, mas pro Sandro isso nunca foi um problema. Era um insegurança momentânea que o seu próprio temperamento tratava de resolver sem nunca permitir que se tornasse um problema.

Era impossível alguém não gostar do Sandrão.

Naquele primeiro evento social com o povo da 89, ele resolveu as coisas do jeito dele – acidentalmente.
O salão do prédio da Eliana era cheio daquelas cadeiras brancas de plástico e o Sandrão tava com a gente no balcão dos salgadinhos dizendo justamente que não sabia como agir, porque ele não conhecia ninguém direito e, daí, ele arrastou uma cadeira pro lugar onde todo mundo estava, bem no centro da festa, e foi timidamente se sentando, sorrindo pra quem quisesse ver, porque era assim que ele era mesmo.
O Sandrão, naquela época, era gordo. Essas cadeiras brancas que os prédios usam em salões de festa têm um jeito peculiar de te dizer que você está gordo. Elas abrem as pernas e te derrubam no chão.
Foi isso que rolou com o Sandrão.
O Zappa e eu estávamos rindo da cara do Leandro Conti, que ia trabalhar na virada do ano, imitando barulho de rojão, fazendo contagem regressiva pra virada e o Leandro ia ficando cada vez mais vermelho, quando o Sandro finalmente depositou todo seu naquela maldita cadeira.
A cadeira abriu as pernas e o Sandro caiu de costas no chão, de um jeito vergonhoso.
Como se isso não bastasse, quando a cadeira se livrou do peso do Sandro, ela pulou pra longe, como se estivesse com medo e ficou no canto do salão, com as pernas pra cima – uma delas, quebrada ao meio.
A gente já estava rindo por causa do Leandro e não parou. Era impossível não dar risada. A gente até tentou. O Zappa arregalou os olhos, botou a mão na boca e olhou pra mim com aquela cara de “FODEU”. O Leandro, que já estava vermelho porque a gente tava rindo dele, adquiriu um novo e surpreendente tom bordô e explodiu numa risada cheia de cuspe.
Nem deu tempo de ajudar o Sandrão a levantar. Quando a gente parou de rir, ele já estava de pé, rindo da própria cara.
Sem querer, daquele jeito, ele quebrou todo o gelo em torno dele e, quando a festa acabou, ele já era da casa. E continuou sendo da casa. Mesmo depois que todos nós saímos: a Eli, o Leandro, o Zappa e eu. De todo mundo que estava na festa, ele foi o único que continuou na 89.

Ele tinha sido da 97, tinha sido da Transamérica e chamava de “falecida” porque morria de medo de falar o nome da rádio errada no ar.

Eu tava na reunião em que a gente decidiu que o Sandrão é que ia pro helicóptero pra fazer reportagem pro Rock Trânsito da 89.
Naquela época, eu fazia as anotações com desenhos e, quando ficou definido que o Sandrão é quem ia ser o repórter, desenhei um helicótero voando torto, com um cara gordo dependurado nele. Mostrei o desenho pra ele e ele me repetiu o que diria várias vezes, num tom muito parecido com uma declaração profunda de amizade: “Tucori, você é um filho da puta”.

Lembro de uma outra vez, que eu ia saindo de casa muito cedo pra trabalhar e vinha ouvindo o Cadu no ar. Eram os últimos minutos dele antes que o Sandrão assumisse e o Cadu teve um ataque de riso monumental do ar, daqueles que você acha que dá pra superar e falha – GRANDE. O Cadu tinha só que falaras músicas que ele tinha tocado e anunciar a próxima, mas, no meio daquele ataque de riso, não deu. Ele quis manter a linha, mas a voz tremia, o ar sumia e ele acabou deixando a risada sair e jogou a próxima música no ar, sem nem dizer o que era. Quando cheguei na rádio, perguntei pro Cadu, que ainda estava por lá, o que tinha havido e ele teve o ataque de riso outra vez, só que fora do ar. Ele explicou que abriu o microfone justo na hora que o Sandrão entrou no estúdio e que, sem dizer uma palavra, o Sandrão foi até uma das caixas de som e ficou ali, de costas pro Cadu, agasalhado como um esquimó, olhando pra caixa. O Cadu olhou pra ele, o Sandro virou pra trás, olhou pro Cadu, deu uma risadinha e continuou olhando a caixa de som. Quem conheceu o Sandrão sabe que, mesmo sem ter a menor intenção de fazer disso uma piada, era impossível não se esfalfelar de rir quando ele fazia essas coisas dele, de parare ficar pasmando numa caixa de som que sempre esteve lá, cutucar acaixa com o dedo e olhar pra você como se dissesse “ó, cara: uma caixa de som”. Não dá pra explicar como isso é engraçado, mas, acredita em mim: é engraçado p-a-r-a c-a-r-a-l-h-o.

Uma mania que o Sandrão tinha era de ficar botando o pingente de qualquer colar que usava na boca. Não tinha sacado isso ainda quando, em 96 (acho) brinquei com ele por causa de uma pedrinha que ele carregava pendurava no pescoço, mas ficava o tempo todo com ela na boca. Daí, o Sandro me contou uma história genial que rolou com ele no motel, a gente riu pra caralho, mas o que deixou o cara realmente orgulhoso foi quando ele foi embora de lá e o povo da portaria pediu autógrafo porque ele era locutor da 89.

Tem outra história engraçada. A gente dava risada do Sandro porque, toda vez que ele tocava Marvin Gaye, ele dizia a mesma coisa: que o cara tinha sido assassinado com um tipo pelo próprio pai. Brincando, eu pedia pra programação botar música do Marvin Gaye no horário dele e toda vez que realmente tocava alguma coisa do Marvin Gaye no horário dele, a gente ficava esperando pra ver o que ele ia dizer. Uma vez, tocou e eu fiquei esperando. Lá foi o Sandro: “esse foi o Marvin Gaye, que morreu assassinado com um tiro do próprio pai”. Nada de novo. Botei a máscara de puto da vida e fui pro estúdio em marcha de calcâneo. Entrei, bati a porta de açougue e falei, com o maior tom de esporro que pude emular: “CARALHO, SANDRÃO!”. Ele me olhou com uma cara assustada de cortar coração. Se você me conheceu na época da 89 você sabe que eu tinha coração sim, mas usava pra outras coisas – não pra isso. “A ÚNICA coisa que você sabe sobre o Marvin Gaye é que ele morreu assassinado pelo próprio pai?”. Na época, eu respondia pela parte de jornalismo musical da rádio e podia fazer uma merda dessas - não que eu fizesse, mas que podia, podia. Ele balbuciou alguma resposta encabulada e eu continuei. “CARALHO, SANDRÃO! Botaí também que ele morreu um dia antes do aniversário de 45 anos dele. SABE QUE DIA? DIA PRIMEIRO DE ABRIL! O cara morreu no dia PRIMEIRO DE ABRIL, PORRA! Sabe o que acontece com quem morre no dia PRIMEIRO DE ABRIL?”. Acho que eu devo ter deixado escapar uma ponta de riso, porque ele já me olhava intrigado e fez um “quiquié?” com o queixo, pedindo que eu contasse o que acontecia com uma pessoa que morre no dia primeiro de abril. “A pessoa morre de verdade no dia da mentira”, eu respondi. A gente se mijou de dar risada dentro do estúdio e ele contou que tinha acreditado de verdade que aquilo era um esporro. “Você é um filho da puta, Tucori! Um filho da puta”, ele disse.

Hoje, quando fiquei sabendo da morte do Sandrão, fiquei puto porque – CARALHO, SANDRÃO! - dirigir bêbado dá merda. Pode não dar agora, mas é certeza vai dar. Deu comigo: eu quase morri porque um carro dirigido por um bêbado cruzou, literalmente, meu caminho.
Posso passar dias aqui escrevendo coisas legais e engraçadas sobre o Sandrão.
DIAS.
Porém, se eu não digo isso, que ninguém deve dirigir bêbado – e MUITO MENOS dirigir MOTO – nada disso vale.

De resto, queria que tivesse sido o contrário do que foi com Marvin Gaye.
Queria que o Sandrão tivesse morrido de mentira.
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4.3.09

eu também quero subir pelas paredes




(foto de patricia grigio)


O Chico era um cara sensacional. Ele era o porteiro da noite da 89 naquele ano em que comecei a trabalhar lá, em 1995. Trabalhávamos lado a lado, o Forlani e eu. Nossa função lá era atender os ouvintes que ligavam pra rádio entre 19h00 e 01h00. Foi uma época boa pra caralho.
De tarde, quem atendia era a Susan e, de manhã, o Paulo Zappa.
Fazer amizade com o Forlani não foi uma coisa muito difícil. A gente lia os mesmo gibis, ouvia músicas parecidas e acho que, de certa forma, é assim até hoje.
O Chico não.
O Chico era uma pessoa que, só de olhar, você ia perceber que ele não estava a fim de conversa. Ele sempre usava camisetas da rádio. Algumas delas estavam tão puídas que os pêlos do corpo dele – e ele era peludo pra caralho – passavam por entre os vãos da malha e os estagiários riam disso, escondidos.
Só que o Chico era um puta cara legal. Você não podia folgar com ele, é claro – mas, também, quem é legal com gente folgada. O Chico gostava das coisas feitas do jeito certo e, pra ele, ordens eram ordens. E ele só recebia ordens do dono da rádio. Por isso, ele era o homem de confiança do cara. Porque, depois de tantos anos recebendo e cumprindo ordens, você garante esse status.
Assim sendo, fui percebendo que, se eu deixasse o Chico em paz, ele me deixaria em paz também. A gente foi conversando, ele foi me ensinando coisas sobre a rádio e, quando foi ver, a gente já tava amigo. Acho que foi no dia que um ouvinte me ligou perguntando se aconteceu alguma coisa, porque a rádio pegava na casa dele e, naquele dia, não estava pegando. Disse que ia ver e comentei com o Chico, pra ver se ele sabia com quem eu podia falar a respeito do assunto. Ele coçou a cabeça, perguntou se eu sabia de onde o rapaz que ligou era, eu disse que era de Ribeirão Pires e ele disse “vem comigo”. Ele me levou até o transmissor da rádio, ms não me deixou entrar. Ordens são ordens e ninguém entrava ali. Depois soube o porquê. Ele foi lá, tirou a rádio do ar uns segundo e mandou ver um reboot no transmissor. “Liga pro menino e vê se resolveu”.
Liguei pro menino. E tinha resolvido. “Tá pegando melhor que nunca agora”. E me agradeceu de verdade – o que era pagamento maior que os cem conto que a gente ganhava na época. Foi lá comentar com o Chico e ele disse na maior simplicidade: “Olhei lá e uns vermelhinhos que antes tava nos 70, agora tava na casa dos 30. Desliguei e liguei de novo e aí, foi pra 90. Ficou melhor, não ficou?”.
É.
Ficou.
E eu fiz esse preâmbulo todo pra mostrar quem é o Chico de verdade – um cara legal, porque ele, as vezes, podia ser um primor de grossura. As histórias das lendárias brigas dele com o Morcegão eram lendárias. Diziam que teve uma vez que voou leite pra tudo quanto era lado da cozinha.
Houve uma vez também, que o Renato Russo chegou na rádio, estava atrasado pra um programa e achou que podia passar batido pela portaria. Ledo engano. Ele ainda tentou argumentar e disse o Chico: “Sabe quem eu sou? Eu sou o Renato Russo!”. Ao que o Chico, primorosamente respondeu: “E você sabe quem eu sou? Eu sou o Chco da 89!”.
Só que não é isso também.
Tem uma ainda melhor do Chico, que foi na época que eu atendia telefone da madrugada, já sem o Forlani e tinha aquela promoção com a música “Spiderman”, dos Ramones. A música tocava, você tinha que ligar e dizer a frase “eu também quero subir pelas paredes”. Aí, no fim do dia, você podia ganhar um curso de alpinismo indoor. Na épica época de Rogério Cappia na promoção, não se brincava em serviço, meu velho.
Só que na 89, havia dois telefones. O telefone do ouvinte e o telefone comercial. Os ouvintes, as vezes não sabiam o telefone da rádio e ligavam no auxílio à lista e, lá, eles davam o telefone da rádio – o comercial.
Se, por um lado, quem atendia o telefone do ouvinte – no caso eu – era um primor de educação, por outro lado, quem atendia o telefone comercial era o Chico.
Numa dessas noites, a música tocou. Tentei atender o máximo de ouvinte que fosse possível e deixei o telefone fora do ganho na música seguinte, pra não ter que lidar com mimimi de quem não ligou na hora certa.
Levantei e fui tomar um café.
Quando eu já ia voltando pra minha mesa, me chega o Chico, coçando a cabeça, e me vem com essa:
" Escuta, o Fernandinho.... Esses ouvintes daí da rádio, eles não são meio esquisitos não?"
"Esquisito como, Chico?"
"Esquisito de viado. Agora mesmo ligou um lá no meu telefone, eu atendi e ele me disse: ‘eu também quero subir pelas paredes”. Disse a ele: ‘o cu é seu e você faz o que você quiser’. E desliguei o telefone”.
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3.3.09

quando conheci a cássia eller




conheci a cássia eller em 98 (acho), quando trabalhava na 89.
fui com ela pro estúdio e a gente tinha que gravar "pressão total".
o pressão total era um quiz da 89, em que rolavam perguntas,
tinha um tempo determinado e as pessoas tinham que responder.
geralmente eram ouvintes, mas as vezes tinham convidados.
já tinha feito com o clemente (dos inocentes)
e ele ficou tão nervoso que não respondia nada
e a gente brincava que tinha sido "o silêncio dos inocentes"

quando a cássia chegou, ela tava muito louca.
então, me mandaram ir lá e ver no que dava.
expliquei pra ela como era a brincadeira
e ela abriu uma cerveja no dente falando comigo

na hora que começaram as perguntas
ela olhava pra mim com um olharque soletrava um F-O-D-E-U
aí, ela começou a inventar as respostas
e, quando acabou, ela não fez nem trinta pontos.

aí, lá foi ela abrir outra garrafa no dente outra vez
e aquilo me deu nos nervos:
"dá isso aqui e deixa eu abrir essa garrafa que nem homem"
ela deu uma risada gostosa e me estendeu a garrafa
botei ela na quina da janela do estúdio
dei um tapão na tampa
a tampa arrancou um naco de madeira da janela
e saiu na minha mão.
dei um passo atrás,
longe do alcance dos olhos do resto da rádio
e dei um gole na cerveja.
devolvi pra ela.
"mas você não disse que ia abrir como homem?
achei que vc ia abrir com o dente!"
e eu: "eu sou um homem, moça.
não um abridor de garrafa".

e a gente deu risada pra caralho
e terminou de beber aquela garrafa
enquanto o povo preparava uma nova bateria de perguntas.
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