Se fosse pra alguém ter uma estátua erigida bem no meio do clube de campo, aquela estátua que todo mundo olharia e diria "sem esse filho da puta não teria nada disso aqui", seria para o cara que teve ideia de lotear o terreno vizinho ao clube de campo e fazer dele uma espécie de cidadezinha de veraneio.
Uma vilazinha de nada.
Duas avenidas principais, meia dúzia de transversais e um caminhozinho esburacado, que passava rente à cerca que estabelecia a permeabilíssima fronteira entre o mundo e nós - os irredutíveis.
Foi esse cara - sem nome, sem rosto e sem memória que conte sua história - o causador de tudo isso.
Nós, a molecada que foi condenada a ir pra lá porque seus pais acharam bom negócio construir uma casa bem ao lado do clube de campo que frequentavam, éramos o bando mais hetereogêneo que podia haver.
A gente se juntou do jeito que deu.
Éramos todos náufragos na mesma ilha. A gente cresceu lá, viveu lá e, como todo mundo, saiu de lá.
O clube de campo, no entanto, nunca saiu de nós.
No começo, a gente odiava o filha da puta miserável que tinha inventado esse maldito clube de campo de concentração.
Depois de um tempo, embora nenhum de nós fosse iluminado o bastante pra perceber, ele passou a ser o responsável por nós termos nos tornado o que nos tornamos - os párias mais integrados do universo.
Agora, passados tantos anos, acho que todos nós nos sentiríamos impelidos a arrancar, com os dentes, a cloaca do primeiro pombo que se atrevesse a cagar na estátua e na memória desse cara que a gente nem sabe se ele existiu.
Aquilo foi nossa vida durante um tempo.
Esse tempo já passou, mas a memória permanece.
(continua...)
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