28.5.09

As bolas de Ali (divididas em várias partes) FINAL





Nesta última parte, eu deixei pra contar algumas histórias que ouvi, vi e li a respeito de Muhammad Ali e que me chamaram atenção. São aquelas histórias que a gente não precisa necessariamente encaixar na cronologia e, por isso, optei pra deixar por último.

Billy Crystal é um grande amigo de Ali. Foi ele que anunciou que ele havia ganhado o prêmio de esportista do século pela Sport Illustrated, em 199, dizendo a mesma frase que eu plagiei na primeira parte do texto: “o que é possível dizer a respeito de Muhammad Ali que ele mesmo já não tenha dito?”.

Crystal disse que um dia estava junto com Ali e sua esposa, Yolanda, e, de repente, ao seu lado começou a ouvir uma espécie de ronco. Olhou e Ali estava ferrado no sono. Nessa época, ele já estava aposentado e, então, Crystal perguntou pra esposa dele se não era melhor acordá-lo e ela, com olhos de terror, disse bem baixinho que andava preocupada com Ali porque ele vinha tendo sonhos com suas lutas passadas e que, no meio desses sonhos, ela tinha que sair do quarto porque ele começava a chamar pelos nomes do lutadores e a soltar porrada pro lado que estivesse virado – que geralmente era o dela. Nessa mesma hora, ele sentiu uma porrada na nuca e Ali, que disse “i’m gonna knock you out, Bugner” já armava a próxima. No momento que Crystal se encolheu, achando que estava fodido, Ali começou a gargalhar, mais acordado que nunca, e contou que era brincadeira, que os dois tinham inventado aquilo tudo só pra fazer uma pegadinha.

Pegadinha era uma coisa que ele curtia fazer desde pequeno, quando amarrava um barbante na cortina do quarto dos seus pais só pra fazer ela se mexer depois que eles estivessem na cama. Outra coisa que Ali fazia quando era moleque, era ficar por horas escondido dentro de armários, esperando pra quem alguém fosse abrir e ele pudesse assustar quem quer que fosse.

Acho que é a Yolanda que diz que acha que a coisa mais notável que seu marido tem é que, na idade dele, as crianças ainda vão até a porta da casa dela e perguntam: "tia, Ali pode sair pra brincar?".

Com Parkinson, ele arrumou um outro jeito de fazer as mesmas coisas. Tem uma entrevista dele, que inclusive foi adaptada pra uma peça sobre Ali que esteve em cartaz na Broadway, em que ele diz que a melhor coisa do Parkinson é que ele não precisa mais fazer as coisas chatas que as pessoas querem que ele faça. Se alguém pede alguma coisa que ele não está a fim, ele finge que não ouviu, se a pessoa começa a perguntar coisas que ele não quer responder, ele começa a responder coisas vagas e aleatórias até o chato ir embora.

Logo que eu comecei a escrever sobre Ali, o Zé Carlos, redator do Pânico, me chamou a atenção pra este vídeo de Ali com George Bush. Na época, Bush era presidente e Ali, com Parkinson e tudo, foi eloqüente como só ele saber ser.
Olha só:



Hana, filha de Ali, conta que, por ser muçulmano, Ali não comemorava o Natal. Mesmo assim, quando era noite de Natal, ele chegava pra ela e dizia: “Hana, vai pegar a lista telefônica”. Ele abria a lista, aleatóriamente, ligava pra qualquer número e dizia “Oi, aqui é Muhammad Ali. Feliz Natal”.
Uma vez, faz muito tempo, numa noite de Natal no clube de campo do Palmeiras, eu liguei pra uma atendente da saudosa Telesp e disse “Olha, eu não conheço você, mas liguei só pra dar um feliz Natal” e a atendente achou bonito a ponto de chorar. Então, não menospreze isso. Faça um dia, mas faça de verdade: realmente ligue pra desejar um feliz Natal praquela pessoa que você não sabe quem é, mas sabe que foi escalada pra trabalhar quando devia estar com a família dela.
Talvez você entenda.

Hana também conta que Ali é o cara que mais dá autógrafo no mundo. Ele nunca recusou um pedido de autógrafo porque, uma vez, quando ele estava bem no começo, pediu um autógrafo a Sugar Ray Robinson e ele disse que estava com pressa e não poderia dar.Depois daquele dia, Ali jurou que, quando fosse famoso, jamais faria com ninguém aquilo que havia sido feito com ele.
E ela disse ainda que, se você é fã do Ali e quer que ele te ligue pra dar um alô, é só mandar o número. Pode ser que ele realmente te ligue pra dizer “oi”.

Outra história magnífica de Hana é a respeito de Myia, uma das filhas ilegítimas de Ali (ele tem duas, Miya e Khaliah). Myia não se parece com Ali e, quando ela era pequena, todo mundo dizia que ela era mentirosa por sustentar que era filha de Ali. Quando soube disso, Ali foi até a escola da menina e ficou o dia todo com ela, assistiu aula com ela, levou-a pra casa e passou o resto do dia, andando com ela pra lá e pra cá.

Outra coisa que me fez rir, foi saber que Ali, pessoalmente, pediu pra que Will Smith fizesse o papel dele no cinema. “Você não é tão bonito quanto eu, mas serve”, Ali disse.

Porém, o que eu achei mais emocionante de tudo foi na abertura da Olimpíada de 1996, quando Ali ficou responsável por acender a tocha olímpica de Atlanta. Mesmo com toda a tremedeira da síndrome de Parkinson, ele foi até lá, mostrou ao mundo todo sua cara, sua doença e, sobretudo, sua coragem em estar diante do mundo e se mostrar do jeito que é – seja ele qual for.

Lembro que quando vi isso, ao som de “Ode to Joy”, de Beethoven, alguém na sala disse “olha como ele treme” e, quando achei que falavam do Ali, falavam de mim, que tava tremendo também, de medo dele não conseguir acender nada.



A idéia sempre foi terminar esse post com as palavras do próprio Ali e, no site oficial dele, achei esse vídeo aqui que vale como um bom final, bem clichêzento, pra essa “Saga Ali” no Fantástica Fábrica de Barulho.

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