Tempo atrás me veio a idéia de jerico de escrever sobre bolas.
O primeiro texto que escrevi sobre o assunto me dá vergonha de ler – quanto mais de publicar.
O que aprendi com ele, vale repetir: nunca escreva sobre as suas bolas.
Escreva sobre as bolas dos outros, mas, sobre as suas, nem pensar.
Daí, foi ver sobre as bolas de quem falar.
Não precisou procurar muito.
Assim que um velho amigo meu conseguiu passar pra DVD a minha VHS de “Quando Éramos Reis”, um documentário de Leon Gast sobre Muhammad Ali e a luta dele contra George Foreman, ficou claro que as bolas seriam dele.
Campeão mundial dos pesos pesados três vezes e um ativista político bem incomum – aquele tipo que sobrevive à própria biografia.
A merda é: o que é que eu possa dizer sobre Muhammad Ali que ele mesmo já não tenha dito – e melhor que eu?
Primeiro: você precisa ter bolas pra gritar pra todo mundo “eu sou o maior de todos” antes de ser, de fato, o maior de todos.
Se você fosse técnico de boxe e um maluco telefonasse pra você dois anos antes da olimpíada e dissesse “você tem que me treinar porque eu sou o maior de todos e vou ser o novo campeão olímpico”, o que você faria?
Angelo Dundee, achou que aquele tal Cassius Clay era louco.
Dois anos depois, Ali (que então usava o nome de batismo Cassius Clay) ganhou medalha de ouro na olimpíada de Roma. (Tem um vídeo aqui)
Medalha essa que – verdade ou não – suas bolas fizeram com que ele a jogasse no rio Ohio, depois de ter sido barrado em um restaurante que só permitia entrada de brancos.
Ali nasceu no pior lugar dos EUA para se ser negro – Louisville, Kentucky, lar da KKK.
Nascer negro naquele lugar e naquela época já é o bastante pra imortalizar suas bolas pra sempre.
Ali, no entanto, tinha outros planos pra elas.
Em 1964, ele enfrentou o campeão dos pesos pesados, Sonny Liston, como desafiante. Já na pesagem, Ali causou tanto, dizendo que ia derrubar Sonny no oitavo round, que ia flutuar como uma borboleta e picar como uma abelha que as mãos de Sonny não iam conseguir atingir o que seus olhos não poderiam ver. Porque ele, Ali, era mais jovem, mais rápido e mais bonito que o campeão e, na opinião do desafiante, pelo menos bonito um campeão deveria ser.
Entenda isso: haver um negro na TV, em 1964, gritando pro mundo que ser negro é bonito fez de Ali tão importante quanto Malcolm X e Martin Luther King.
Mesmo assim, muita gente achou que a postura dele era pra disfarçar o nervosismo e as apostas eram em 7 contra 1, em favor de Sonny. Ali dizia que ia derrubar Sonny no oitavo assalto e que, quem tivesse amor pelo próprio dinheiro, deveria apostar em um novo campeão.
"Sonny Liston is nothing. The man can't talk. The man can't fight. The man needs talking lessons. The man needs boxing lessons. And since he's gonna fight me, he needs falling lessons"
O show da pesagem, dá pra ver aqui.
Porém, o melhor mesmo foi a luta.
Nos primeiros assaltos, o problema de Liston ficou bem claro.
Foi quando ele percebeu que era sério – ele não conseguia acertar Ali.
Ele tentou, de todo jeito, usar o seu golpe limpo mais mortal de todos, mas, quando soltava a porrada, Ali já não estava mais lá.
Liston apelou para o seu golpe sujo favorito que, segundo historiadores de boxe, jamais havia falhado.
Ele colocava uma substância cáustica em suas luvas e ia pra luta.
Quando as luvas atingiam o rosto do outro lutador, por mais fraco que fosse o golpe, aquela solução espirrava nos olhos do adversário e ele ficava temporariamente cego.
Era tempo o bastante pra que Linston finalizasse a vítima.
Não foi assim com Ali.
Mesmo cego, o desafiante fez das tripas coração pra se defender.
O quarto round foi todo de Liston, com Ali fugindo, tentando entender o que estava acontecendo.
No intervalo, Angelo Dundee sacou o que havia e, no meio do quinto round, Ali estava quase bom mais uma vez e, no sexto round, surrou Sonny.
Coloque-se no lugar de Sonny Liston: se no primeiro assalto, descansado, você já não conseguia atingir o cara, você lançou mão do seu golpe mais sujo e ele não funcionou... e agora?
Tem um sétimo round todo pra lutar e Ali prometeu que ia te derrubar no oitavo.
O que você faz agora?
Sonny fez o que fez: não levantou do seu banco ao fim do sétimo round.
Ali, arrastando todos os que o abraçavam em cima do ringue, correu para as cordas e berrou, com toda a força dos seus pulmões: “
Comam as suas palavras: eu sou o MAIOR! I SHOOK UP THE WORLD!”.
“I'm king of the world! I'm 22 years old and ain’t got a mark on my face, I'm pretty, I easily survived six rounds with that ugly bear, because I am the greatest."
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