18.2.09

O homem que roubava maquetes




Ele era um cara legal, diziam seus amigos.
Não falava mal de ninguém e ninguém falava mal dele.
Sair com Miqueloni era sempre divertido.
Pagava bebida, dividia as despesas e, as vezes, bancava tudo sozinho, só pra ter a companhia de um amigo sem grana.
Ele queria que se fodesse.
Valia tudo pelas risadas.

Só que Miqueloni tinha uma peculiaridade que ninguém sabia.

Talvez, de tanto ver filmes, começou a planejar pequenos roubos.
Nada que fizesse muita diferença ao bolso de alguém, porque grana não era o tipo de coisa que faltava à Miqueloni.
Ele gostava do jogo.
Miqueloni curtia a molecagem.

Ele só roubava maquetes de prédio, daquelas que ficam dentro dos boxes de atendimento aos futuros compradores.

Pra isso, ele fazia tudo que podia.
E tudo valia.

Chegou a ter a audácia de entrar no cubículo de vidro, aproveitando a moleza dos corretores – que mostravam os buracos da fundação pros compradores - e, daí, sair correndo pra dentro de uma casa cujo muro sabia que era capaz de pular - mesmo carregando uma miniatura de edifício nas costas.

Ele morava na Pompéia, em 2001 e aquela era uma época em que os empreendimentos comiam soltos no bairro, pro desagrado dos moradores mais antigos.
Miqueloni não era exatamente um morador antigo, mas era palmeirense e isso lhe dava direitos e deveres sobre as imediações da arena de seus heróis.

Uma justificativa é o que faz o crime compensar e, pra ele, havia como justificar as merdas que ele fazia.
Era um protesto contra a verticalização do bairro da Pompéia.
O discurso estava pronto e, mesmo que ele fosse em cana, o povo da associação dos moradores soube dele e diz-se até que expediu ordens à polícia, que já acha romântica a história e sempre deixa o homem que rouba maquetes escapar.

Miqueloni, no entanto, sabe em seu íntimo que as coisas não são assim.

Ele tinha uma meta, que era roubar maquetes o bastante pra forrar todo o chão do quartinho do porão só com maquetes de prédios e alguns outros presentes de amigos, estudantes e professores de arquitetura.

A meta havia sido cumprida.

Depois de anos de esforço e correria, o chão estava finalmente coberto com prédios e ali estava ele.

No meio daquela mini cidade, Miqueloni sorriu enquanto olhava em volta.

Botou o vinil de “Specters”, do Blue Oyster Cult e, quando tocou “Godzilla”, ele urrou pra assustar Deus e arrasou a cidade toda sob seus pés.

E nunca mais ouviu-se falar do homem que roubava maquetes.
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2 comentários:

Calu Baroncelli disse...

hahahahahahah fantástico!

Joice Viana disse...

Ô Tucori, isso aí aconteceu mesmo?! Hahahaha
Manda um beijo pro Herbert Vianna (quase meu primo) e diz pra ele que 'Ela disse adeus' virou um hino nacional do pé na bunda =)