26.1.11

O Ano do Gato



Dia 25 de janeiro, ele chegou em casa. A Joh e eu fomos buscar o Fellini lá no Circo Vox, perto da Avenida Santo Amaro – coisa que fez com que minha amada tivesse seu primeiro contato direto com a estátua do Borba Gato. Digo e repito que, em caso de invasão alienígena, o Borbão vai ser nossa única esperança. Tipo o Goldar, aquele robô cabeludo, loiro, que virava foguete.

A mãe do Fellini, uma gata branca e magrela, deu à luz dentro de um baú. Chegamos lá e tava a ninhada inteira batendo cabeça, miando aqueles miauzinho, que gato filhote mia. Ao contrário da Joh, eu nunca tinha sido dono de gato.

A escolha, aliás, foi toda dela. O nome já tava dado antes que a gente tivesse o gato, de fato. Era Fellini e pronto. A Joh não queria ter outra gata e achou lindo um casal de gatinhos, que eram cinza. Uma fêmea, outro macho. Ficamos com o macho. Era o Fellini.

E pra levar o bichinho pra casa. Ele não devia ter nem um mês de idade, mas a Joh tomou a criaturinha como se fosse filho dela e, enquanto eu buscava duas coisas fundamentais – um lugar pra mijar e um táxi – o Fellini já se acostumava com o perfume dela.

Quando a gente entrou no táxi – janeiro em São Paulo, remembah? - nuvens negras iam se formando sobre nossas cabeças como a Fiel tomando o Pacaembu. Eu queria carregar o Fellini, a Joh queria carregar o Fellini e o Fellini não queria ser carregado por ninguém. Fiquei com medo que o motorista o táxi implicasse com o gato, mas ele nem ligou. A gente também nem ligou.

Naquela época, o Fellini tinha os olhos azuis. Olhos de filhote. E a Joh me perguntando se eu tinha certeza que queria um gato. Eu achava que sim, claro, mas queria ver como é que era. Quando o Fellini chegou em casa, se enfiou debaixo do nosso cobertor laranja e lá ficou. Saí pra ir até a General-Au-Au (por que, afinal, toda pet-shop tem que ter um nome engraçadão?) e voltei com uma tigelinha de comida, comida pra tigelinha, uma caixa de areia e, claro, areia pra caixa de areia.

Coisa mais ridícula. O Fellini não sabia beber água. Metia o focinho lá e se assustava. Também não sabia o que era comida. Cagar, cagou de cara. Foi botar areia na caixinha, ele entrou lá e defecou um troção que parecia um tamarindo. Meu orgulho.

Outro orgulho: fui eu quem apresentou o Fellini à água. Deve ser por causa disso que toda vez que um de nós entra no banho, ele dá porrada na porta do boxe como se quisesse ir lá pra dentro. Claro que ajuda o fato de eu ficar lá, debaixo do chuveiro, cantando músicas pra ele (a preferida do Fellini é “Up In Smoke”, do Cheech e Chong, embora quando eu cante a música da Terezinha de Jesus, do Chico, adaptada pra história de vida dele, ele dê uns miados tristes de gaita de blues).

Agora, a Joh é a mãe dele. E o Fellini, como filho, dá trabalho todo dia. Pontuialmente, às seis da manhã, que é quando ele acorda pra brincar e acha que a gente tá acordadão e no pique. Como pai, eu sou o cara que dá comida errada pra ele – tipo bacon. Na real, eu já dei até lichia pra ele – e ele comeu. Acho que o Fellini acha que eu sou o companheiro de caçada dele. Ele gosta quando eu toco violão e, toda vez que eu saio de casa, deixo alguma música pra ele ficar ouvindo.

O mais engraçado é quando eu vou abrir uma caixinha nova de cigarro. Basta ele ouvir o barulho do celofane que ele sai de onde estiver e vem pra barra da minha calça, me puxar com as unhas. Ele sabe que eu vou fazer uma bolinha pra ele brincar. Eu sei que ele vai brincar com a bolinha por 5 minutos e depois vai perdê-la, mas também sei que ele vai achar a maldita bolinha ao toque de despertar, às seis horas da manhã, e vai ficar ciscando em volta dela até um de nós acordar e dar atenção pra ele.
Tudo bem que não dá mais pra deixar papel higiênico no lugar do papel higiênico, tudo bem que ele suba no teclado no meio da noite e fique tocando músicas do John Cage. Tudo bem que ele ponha a Joh de castigo uma vez ou outra. Tudo bem que ele tenha pego um casaco meu pra ele – é a escada pro alto do armário. Tudo bem que ele já tenha quebrado um dos vidros de casa e quase tenha me arrumado treta com os motoboys da pizzaria. Tudo bem que eu cague tijolos cada vez que ele dá um “MIÔU” daqueles que ele dá no meio da madrugada.

Tudo bem.

Foda-se.
Ele é tipo meu filho.
O gato do ano.
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2 comentários:

Joice Viana disse...

Omodeuzu, omodeuzu, omodeuzu <3
Quando li "uma gata branca e magrela..." pensei que fosse eu, daí lembrei que gata e branca eu sou, mas magrela? Foi-se o tempo.
Ele tá aqui, do mesmo jeito que tá aí na foto. E a gente tá te esperando. E a gente te ama.

Kakaya disse...

Aiiiii que legaaaal!rsrsrs! Eu sempre gostei de cachorro mas nunca tive. Meu irmão já conseguiu ter vários gatos e até o meu pai durão eles conquistaram. Adorei a história! Beijos pra vcs!